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Como segredos comerciais impulsionam a indústria automobilística internacional
Strategy ago. 1, 2025

Como segredos comerciais impulsionam a indústria automobilística internacional

Para poder adentrar no mercado chinês, empresas como Toyota, Volkswagen e BMW são obrigadas a trabalhar com fabricantes locais, os quais, por sua vez, obtêm acesso a conhecimento fundamental.

illustration of auto factory where two executives are shaking hands on the assembly floor

Jesús Escudero

Based on the research of

Jie Bai

Panle Jia Barwick

Shengmao Cao

Shanjun Li

Em 2001, a indústria automobilística chinesa vendeu menos de um milhão de carros. Em 2017, a mesma indústria foi responsável por mais de um terço de todos os carros produzidos ou vendidos no mundo. A qualidade também melhorou: de 2001 a 2014, as taxas de defeitos em automóveis chineses caíram 75%. Como isso ocorreu tão rapidamente?

Parte da resposta se deve aos "transbordamentos de conhecimento" por parte das montadoras estrangeiras que fazem negócios com parceiros nacionais na China. Shengmao Cao, professor assistente de estratégia na Kellogg, define tais transbordamentos como "o know-how de produção, às vezes mantido em segredo por uma empresa, que um parceiro tem condições de observar e assimilar em suas próprias operações independentes".

Transbordamentos de conhecimento não são necessariamente dissimulados; eles tendem a ocorrer naturalmente sempre que empresas do mesmo setor operam no mesmo local. Porém, podem também fazer parte de uma estratégia planejada, especialmente em países em desenvolvimento, cujos governos frequentemente obrigam empresas estrangeiras a unir forças com colegas nacionais do mesmo ramo para poder operar no país.

Esse acordo quid-pro-quo, ou seja, melhor tecnologia em troca de acesso a novos mercados, geralmente assume a forma de uma joint venture entre uma empresa estrangeira e uma local. Por exemplo, os veículos da Volkswagen são produzidos e vendidos na China pela SAIC Volkswagen, uma joint venture de propriedade conjunta da fabricante alemã Volkswagen Group e da fabricante de automóveis chinesa SAIC Motor.

Cao e seus colaboradores Jie Bai, da Universidade de Harvard, Panle Jia Barwick, da Universidade de Wisconsin-Madison, e Shanjun Li, da Cornell University, queriam saber se a melhoria da qualidade da fabricação de automóveis chinesa seria parcialmente explicada pelo transbordamento de conhecimento dessas joint ventures.

“É uma estratégia para subir na 'escada da qualidade' aprendendo com empresas líderes do setor”, explica Cao. “Existem muitos estudos sobre o efeito do transbordamentos de conhecimento investimentos estrangeiro direto em geral, mas há pouquíssimas evidências empíricas sobre esse requisito específico referente a joint ventures. Esta é uma política de longa data na indústria automobilística chinesa. A Índia, Brasil e muitos países do Sudeste Asiático também adotam versões específicas desta política.

A estratégia de fato funciona, de acordo com os pesquisadores. Eles analisaram milhares de pesquisas minuciosas realizadas pela JD Power & Associates entre 2001 e 2014 e descobriram que, durante esse período, os transbordamentos de conhecimento das joint ventures contribuíram com 8,3% das melhorias gerais de qualidade dos carros chineses.

Cao acredita que a quantificação desses efeitos colaterais tem o potencial de ajudar as partes de uma joint venture a entender melhor o quid pro quo, uma questão delicada em meio à intensificação das tensões comerciais. "Para a empresa estrangeira, a opção é obter lucro e potencialmente estimular um futuro concorrente ou perder totalmente o mercado", afirma. "É uma decisão bastante arriscada e uma questão complexa sobre qual seria o acordo ideal".

Qualidade em ascensão

Historicamente, os pesquisadores mediam os efeitos do transbordamento de conhecimento em termos de “produtividade total dos fatores”, uma proporção que comprime todos os variados insumos e produtos econômicos de uma empresa nacional.

“É uma medida informativa, mas pode ser uma espécie de caixa-preta”, diz Cao. “Se a empresa produz mais com o mesmo insumo, significa que é mais produtiva, mas não revela muito sobre como e porquê de tal fenômeno”.

Para se ter medidas mais concretas de como o transbordamento de conhecimento afetou a qualidade da fabricação de automóveis na China, os autores do estudo consultaram pesquisas anuais com clientes conduzidas pela JD Power and Associates. Analisaram avaliações em 19 dimensões diferentes de desempenho e qualidade (como economia de combustível, capacidade de resposta da frenagem e materiais internos) coletadas de quase 19 mil compradores de automóveis chineses entre 2001 e 2014. As pesquisas abrangeram carros fabricados por empresas chinesas como FAW e Brilliance, e também carros fabricados por joint ventures como FAW-Toyota e BMW-Brilliance (que produzem veículos Toyota e BMW, respectivamente, para o mercado chinês).

Ao comparar a mudança nas classificações entre modelos semelhantes produzidos por empresas nacionais e de joint ventures, os pesquisadores conseguiram identificar evidências de transbordamento de conhecimento. Como explica Cao, "uma empresa chinesa que trabalha com uma montadora japonesa [como é o caso da FAW com a Toyota] consegue obter melhorias em eficiência de combustível. Uma empresa chinesa que trabalha com uma empresa alemã [como a Brilliance e a BMW] consegue obter melhorias em desempenho do motor e recursos de segurança. Além disso, analisamos se essas semelhanças surgem e se fortalecem ao longo do tempo, à medida que as empresas trabalham juntas".

Os dados mostraram que esse era realmente o que acontecia. Em centenas de combinações, os pesquisadores observaram que a qualidade dos carros fabricados na China melhorou em dimensões semelhantes às dos modelos estrangeiros produzidos por joint ventures. "Em outras palavras, vimos que os automóveis da Brilliance começaram a ter aparência mais semelhantes aos carros da BMW em termos de seus pontos fortes relativos", diz Cao.

Os pesquisadores estimaram que 8,3% dessa melhoria de qualidade se deve ao transbordamento de conhecimento de joint ventures.

Forte argumento a favor de transbordamentos

Mesmo assim, os pesquisadores queriam descartar outras explicações que fossem além do transbordamento de conhecimento, como empresas automobilísticas nacionais que estavam fazendo parcerias com empresas já muito semelhantes a elas próprias ou com empresas que visam atrair os mesmos tipos de clientes.

Entretanto, embora uma montadora chinesa como a SAIC possa ter semelhanças com a Volkswagen em 2025, é altamente improvável que esse fosse o caso quando da formação da joint venture, décadas antes. “Muitas das empresas chinesas não faziam negócios no setor de automóveis de passageiros; elas costumavam produzir máquinas agrícolas, como tratores, e só começaram a fabricar carros depois de passar por experiências em joint ventures", diz Cao.

As montadoras nacionais e joint ventures também têm como alvo clientes muito diferentes. Isso acontece porque os automóveis Toyotas e BMWs, mesmo quando fabricados com parceiros chineses, ainda são muito mais caros do que carros de fabricação inteiramente nacionais na China.

E se as montadoras chinesas demonstrassem melhorias de qualidade simplesmente por meio do licenciamento de patentes dos parceiros estrangeiros? Os pesquisadores também descartaram essa possibilidade: entre 2001 e 2009, mais de 10 mil patentes foram licenciadas ou transferidas na indústria automobilística chinesa, mas apenas 27 delas se originaram de uma joint venture.

Além disso, após analisar as trocas de empregos observadas nos perfis do LinkedIn de 53 mil trabalhadores chineses que atuam na indústria automobilística, os pesquisadores observaram que a qualidade da produção nas montadoras nacionais melhorou quando os trabalhadores já haviam trabalhado em uma joint venture. Por exemplo, quando mais trabalhadores migraram de empregos na SAIC-Volkswagen para empresas chinesas como a FAW e a Brilliance, pareceu haver maior similaridade na qualidade entre elas. Essa correlação foi especialmente forte quando os trabalhadores migraram de uma joint venture para uma empresa nacional diretamente afiliada (como da SAIC-Volkswagen para a SAIC).

Os pesquisadores não podem afirmar com certeza que as mudanças de emprego que identificaram foram a causa direta do transbordamento de conhecimento, mas acreditam que essa é uma possível explicação promissora. “Pode ser um canal de conhecimento impulsionado por esse fluxo unidirecional de trabalhadores", diz Cao.

Receita para o sucesso?

Um aumento de quase 10% na qualidade da fabricação devido ao transbordamento de conhecimento pode não parecer grande coisa. Porém, esse não é o único tipo de transbordamento que acontece na indústria automobilística chinesa, diz Cao. No seu ponto de vista, é algo diferente, pois ele o vê como uma espécie de "bônus" que as joint ventures adicionam ao valor base do transbordamento para todo o setor, que normalmente resulta do investimento estrangeiro.

“Vejamos um cenário hipotético em que a BMW fabrique seus próprios carros na China sem uma joint venture: o transbordamento ainda ocorreria de outras maneiras, apenas pela presença da [BMW]”, diz Cao. “O que este trabalho mostra é que há um benefício adicional dessa afiliação direta em joint ventures.”

Para empresas estrangeiras, o lado positivo desse tipo de troca é mais obscuro. “Às vezes, as empresas multinacionais às vezes acusam as políticas de joint venture de serem apenas transferências forçadas de tecnologia", acrescenta Cao. "Na verdade, essa é uma das razões pelas quais o Presidente Trump deu início à primeira onda da guerra comercial entre EUA e China em 2018."

As joint ventures também não são necessariamente uma maneira infalível para as indústrias situadas em países em desenvolvimento subirem na escala da qualidade. Montadoras estrangeiras só entram em joint ventures chinesas porque a demanda global por carros é tão grande ao ponto de que "o custo de abrir mão do mercado chinês seria muito alto", diz Cao. Em outros mercados ou setores, o mesmo cálculo de troca de favores possa não fazer sentido. "Esse acordo pode gerar também disputas comerciais", acrescenta Cao.

Mesmo assim, as descobertas de Cao e seus colegas mostram que, nas circunstâncias certas, as joint ventures, e o transbordamento de conhecimento que elas incentivam, podem ser uma vitória nítida para os países anfitriões. "A indústria de automóveis da China, de quase inexistente há 25 anos, chegou a ser a indústria de maior número de vendas de automóveis do mundo em 2010", diz Cao. "Parece uma história de sucesso."

Featured Faculty

Assistant Professor of Strategy

About the Writer

John Pavlus is a writer and filmmaker focusing on science, technology, and design topics. He lives in Portland, Oregon.

About the Research

Bai, Jie, Panle Jia Barwick, Shengmao Cao, and Shanjun Li. 2024. “Quid Pro Quo, Knowledge Spillovers, and Industrial Quality Upgrading: Evidence from the Chinese Auto Industry.” NBER Working Paper No. 27644.

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