Marketing dez. 2, 2016
As pessoas estão twittando sobre produtos. Será que isso irá impulsionar as vendas?
Solicitar conteúdo gerado pelo usuário pode ser uma maneira poderosa de engajar clientes.
Yevgenia Nayberg
Depois de chegar até o topo de uma montanha anos atrás, Robin Arrachart tirou uma foto da vista arrebatadora, enquadrando seus sapatos resistentes e o lanche claramente na foto. Quando os fabricantes do lanche, uma barra do chocolate Kit Kat, promoveram um concurso de "Fã do mês" no Facebook pedindo às pessoas para compartilhar fotos tiradas comendo o chocolate, ela tinha a vitória em suas mãos.
A foto vencedora de Arrachart é um exemplo de "conteúdo gerado pelo usuário", ou UGC na sigla em inglês, cada vez mais procurado pelas empresas nas redes sociais. Ao invés de simplesmente pedir às pessoas para tweetar ou postar que compraram um determinado produto, os concursos de UGC incentivam os consumidores a compartilhar mais detalhes sobre sua experiência com a marca. Ao solicitar um UGC, seja através de foto, comentário ou post sobre como o comprador se relaciona com uma marca, as empresas, obviamente, ganham uma maior consciência do que os clientes estão pensando, bem como obtém material que pode ser usado em publicidade.
Além disso, o modo como essas atividades ajudam as vendas é um mistério a ser desvendado. Será que o UGC pode aumentar diretamente a receita de uma empresa? Em outras palavras, a descrição de uma experiência com a marca pode afetar o comportamento do consumidor de forma real?
"As empresas acompanham o que os consumidores dizem nas redes sociais", diz Bobby Calder, professor de marketing da Kellogg School. "No entanto, trata-se mais de monitorar o sentimento do que se tentar descobrir as consequências para as vendas. É muito difícil fazer a ligação entre o que as pessoas fazem nas redes sociais e o subsequente comportamento na hora da compra".
Mesmo assim, Calder e seus colegas se juntaram para compreender como os posts de uma pessoa nas redes sociais a respeito de uma marca pode influenciar suas compras. Com base em estudos anteriores de sua autoria, a equipe suspeitava que o engajamento do usuário, a conexão pessoal que um consumidor compartilha com um produto ou marca, conforme demonstrado pelo conteúdo que criam, acabaria sendo mais importante do que uma simples "curtida" ou tweet.
Eles descobriram que isto era mesmo realidade. E o impacto dessa conexão pessoal mudou o comportamento do consumidor durante várias semanas.
UMA EXPERIÊNCIA IDEAL DE CONTEÚDO GERADO PELO USUÁRIO
É difícil para as empresas ou pesquisadores separarem o impacto da atividade de redes sociais de outros fatores que possam impulsionar as vendas, como promoções especiais ou o lançamento de novas linhas de produtos. No entanto, um concurso específico nas redes sociais forneceu dados ideais aos pesquisadores.
Desde 1992, um programa de fidelidade de uma coalizão no Canadá, conhecido como Programa de Recompensas Air Miles (AMRP na sigla em inglês), ofereceu pontos de recompensa aos consumidores pelas compras em uma grande variedade de lojas. Os consumidores passam seus cartões de fidelidade para acumular pontos quando compram gasolina, mantimentos, roupas ou outros produtos. Em seguida podem resgatar seus pontos em mercadorias, cartões de presente ou recompensas de viagem. (Apesar do nome, o AMRP não é afiliado a nenhuma companhia aérea). Por sua vez, o AMRP recebe dinheiro das empresas participantes quando os clientes usam os cartões AMRP em compras em uma de suas lojas.
Em dezembro de 2011, o AMRP lançou um "concurso de inverno." Em troca da oportunidade de ganhar pontos de recompensa, os membros foram convidados a compartilhar sua lista de sonhos de consumo sobre o que fariam com os pontos extras. Cerca de 8.000 clientes participaram postando em um site de rede social do AMRP.
A natureza do concurso apresentou uma forte oportunidade de explorar se o UGC se traduz em receita.
"Esta não era apenas mais uma simples atividade de rede social inventada por algum marqueteiro", diz Calder. "Tem todas as características de engajamento em potencial: os membros precisam declarar uma meta em sua vida e falar sobre como ela se relaciona com o uso da marca".
Calder se uniu a Edward Malthouse, da Northwestern Medill School, Su Jung Kim, da Universidade Estadual de Iowa, e Mark Vandenbosch, da Universidade de Western Ontario, no Canadá. A equipe reuniu dados sobre o histórico de compras, bem como os pontos acumulados antes do concurso e no período de seis semanas após o encerramento do concurso. Isto lhes permitiu encontrar grupos de clientes que tiveram atividades de transações semelhantes antes do concurso, mas apresentavam diferenças em relação ao envio ou não de UGC. Os pesquisadores poderiam então comparar o comportamento desses grupos após o concurso.
UMA "FORMA PODEROSA" DE MUDAR O COMPORTAMENTO DO CLIENTE
Os participantes responderam ao concurso de maneiras diferentes. Alguns deixaram respostas curtas, como "liquidificador" ou "câmera digital", para descrever o que fariam com os pontos se ganhassem. Outros, porém, escreveram várias linhas pelos motivos de desejarem o prêmio. Como exemplo, uma mulher escreveu: "Eu não vejo minha mãe há vários anos e quero uma passagem para visitá-la no seu aniversário de 80 anos".
Estes dois grupos de pessoas também se comportaram de forma diferente após o concurso.
Os membros que elaboraram mais a fundo seus objetivos, sendo provável que eles pensaram com mais cuidado sobre o modo como a marca AMRP se relacionava aos seus objetivos ou valores, usaram sua filiação ao AMRP com mais frequência ao fazer compras futuras. Isso se traduziu em um aumento de receita para o AMRP. A mudança na atividade durou quatro a seis semanas após o concurso, muito mais do que normalmente duram os efeitos de uma propaganda.
Na verdade, quanto menos palavras os participantes usavam para descrever seus objetivos, menor era a probabilidade de aumentarem a sua utilização do AMRP posteriormente. O simples pedido a um usuário para gerar conteúdo, muito parecido com o pedido para as pessoas curtirem ou tweetarem sobre um produto, não era suficiente para garantir o seu engajamento.
"O que descobrimos foi que, quanto mais conseguirmos fazer a pessoa pensar sobre seus objetivos e elaborar a respeito deles em um ambiente social, melhor será a cliente que ela se tornará", diz Malthouse. "Isso tem o potencial de ser uma forma muito poderosa de transformar o comportamento dos clientes".
REPENSANDO A ESTRATÉGIA DE REDES SOCIAIS
Concursos de redes sociais como este são muito diferentes das táticas de marketing tradicionais, segundo Calder.
"Aqui você não está tentando convencer as pessoas de que uma marca é valiosa", diz ele. "Ao contrário, você tenta fazer uma conexão experimental, de modo que a marca passa a fazer parte da vida do consumidor de uma forma que se conecte com os objetivos ou valores pessoais relevantes para o indivíduo".
Para os marqueteiros que planejam suas campanhas de redes sociais, os resultados oferecem uma perspectiva valiosa. O engajamento, em vez de simplesmente promover uma marca, pode ser um ponto chave para transformar as atividades de redes sociais em vendas. Ao projetar as atividades ou concursos, Malthouse sugere que os marqueteiros se concentrem em maneiras de fazer os consumidores pensarem sobre como uma marca se relaciona diretamente com seus valores pessoais.
"Anúncios clássicos são destinados a persuadir a pessoa de que a marca lhe trará benefícios, ao passo que a nova linha de pensamento é a seguinte: Em um mundo inundado com publicidade, podemos encontrar formas mais inovadoras e ainda mais poderosas de desenvolvimento de marcas?" diz Calder. "Nosso trabalho não é apenas o estudo de outra atividade de rede social, mas um teste do poder desta nova forma de pensar sobre o marketing".
Malthouse, Edward C., Bobby J. Calder, and Mark Vandenbosch,. 2016. “Creating Brand Engagement on Digital, Social and Mobile Media.” In Rod Brodie, Linda Hollebeek, and Jodie Conduit (eds), Customer Engagement. Routledge. 85–101.