Muitas notáveis histórias de sucesso começam com fracassos: Henry Ford pediu falência antes de fundar a Ford Motor Company; Thomas Edison e seus colegas testaram milhares de materiais antes de criarem a lâmpada de filamento de carbono; a obra de JK Rowling foi rejeitada por doze editoras antes de o primeiro livro de Harry Potter ser publicado.
Sem dúvida que esses são exemplos inspiradores, mas Dashun Wang acreditava que não contavam toda a história. Por que essas pessoas finalmente tiveram sucesso, enquanto tantas outras nunca conseguiram ultrapassar um fracasso?
“Se entendêssemos esse processo, poderíamos prever se alguém seria bem sucedido, mesmo quando ainda está perdendo?”, questiona Wang, professor associado de administração e organizações da Kellogg School e diretor do Centro Científico para a Ciência e Inovação (CSSI).
Em um novo artigo publicado na edição do 150o aniversário da revista Nature, Wang e seus colegas desenvolveram um modelo matemático que identifica o que separa aqueles que têm sucesso dos que apenas continuam tentando. Junto com o doutorando Yian Yin e o pós-doutorando Yang Wang, no CSSI, e James A. Evans, da Universidade de Chicago, Wang descobriu que o sucesso se resume a aprender com os erros anteriores. Por exemplo, continuar a melhorar as partes de uma invenção que não funcionam em vez de descartá-las ou reconhecer quais seções de solicitação de verba rejeitadas devem ser mantidas e quais se deve reescrever.
Isso não significa simplesmente que as pessoas que aprendem mais à medida que avançam em seus esforços têm melhores chances de vitória. Ao contrário, há um ponto crítico. Se a capacidade de aprender com as tentativas anteriores estiver acima de um certo patamar, provavelmente se sairá vitoriosa no final. Se estiver apenas um pouco abaixo desse limite, poderá estar condenado a gerar fracassos atrás de fracassos.
“As pessoas dos dois lados do limite podem ser exatamente o mesmo tipo de pessoa”, diz Wang, “mas terão dois resultados bastante diferentes”.
Usando esse insight, os pesquisadores podem prever corretamente o sucesso de alguém a longo prazo com umas poucas informações sobre suas tentativas iniciais.
Medindo o sucesso em três domínios diferentes
Um número crescente de pesquisas apoia a ideia de que o fracasso pode fazer com que uma pessoa melhore no longo prazo. Na verdade, em outro estudo recente, o próprio Wang descobriu que um revés no início da carreira muitas vezes deixa os cientistas prontos para o sucesso no futuro.
No entanto, como as histórias de Ford, Edison e Rowling demonstram claramente, o caminho para o sucesso normalmente tem mais do que um único revés. “Você simplesmente não fracassa só uma vez”, diz Wang. “Você fracassa repetidamente”. E, embora essa ladainha de fracassos possa melhorar a situação dos Edisons desse mundo, a mesma parece frustrar muitas outras pessoas.
Para Wang e seus colegas entenderem o motivo foi preciso muita informação sobre o processo de cair, se levantar e tentar novamente.
Eles se voltaram para três enormes conjuntos de dados, cada um deles com informações sobre tipos muito distintos de fracassos e sucessos: 776.721 pedidos de subsídios submetidos ao National Institutes of Health (NIH) entre 1985 e 2015; o banco de dados da National Venture Capital Association de todas as 58.111 startups que receberam financiamento de capital de risco de 1970 a 2016; e o Banco de Dados Global de Terrorismo, que inclui 170.350 ataques entre 1970 e 2016.
Essas fontes permitiram aos pesquisadores rastrear grupos e indivíduos ao se engajarem em repetidas tentativas ao longo do tempo para atingir seu objetivo: obter financiamento subsidiado, levar sua empresa a ser adquirida por valores elevados ou realizar um IPO, ou, no caso de organizações terroristas, realizar um ataque com pelo menos uma fatalidade, o que certamente é uma medida sombria de sucesso.
Os três domínios “não podem ser mais diferentes entre si”, diz Wang, “mas, por mais diferentes que pareçam, o interessante é que todos acabam mostrando padrões muito semelhantes e previsíveis”.
A sorte ou o aprendizado levam uma pessoa a ser bem-sucedida?
Com os dados em mãos, a equipe começou a pensar sobre o sucesso e o fracasso no nível mais simples. O sucesso, eles teorizaram, deve ser o resultado de um dentre dois fenômenos básicos: sorte ou aprendizado. As pessoas que se tornam bem-sucedidas em uma determinada área ou melhorar constantemente com o tempo ou são beneficiárias do acaso. Portanto, os pesquisadores testaram ambas as teorias.
Se as vitórias forem resultado do acaso, imaginou a equipe, todas as tentativas têm a mesma probabilidade de sucesso ou fracasso. Assim como em um sorteio, onde o que aconteceu antes não influencia muito o que acontece futuramente. Isso significa que a centésima tentativa de uma pessoa normal não terá mais sucesso do que a primeira, uma vez que os indivíduos não estão melhorando sistematicamente.
Assim, em seu conjunto de dados, os pesquisadores analisaram a primeira tentativa e a penúltima tentativa (aquela logo antes de uma vitória) para cada aspirante a cientista, empresário e terrorista. A fim de medir a melhoria (ou a falta dela) ao longo do tempo, os pesquisadores analisaram as mudanças na forma como os pedidos de verbas científicas foram avaliados, a quantidade de financiamento de risco que as startups receberam e o número de indivíduos feridos em ataques terroristas.
A análise revelou que a teoria do acaso não funciona. Nos três conjuntos de dados, a penúltima tentativa de um indivíduo tendia a ter maior probabilidade de sucesso do que seu primeiro esforço.
No entanto, o aprendizado das pessoas não se deu da maneira que os pesquisadores esperavam. A ideia clássica da curva de aprendizado rege que, quanto mais se faz algo, maior é a proficiência. Portanto, se todos no conjunto de dados aprendem com a falta de êxito anterior de forma confiável, suas chances de sucesso deveriam aumentar drasticamente a cada nova tentativa, levando a sequências curtas de fracassos antes do sucesso.
Porém, os dados revelam sequências muito mais longas do que os pesquisadores haviam previsto.
“Embora o desempenho melhore com o tempo, há ainda maior fracasso do que o esperado”, explica Wang. “Isso sugere que se está preso em algum lugar, que está tentando, mas não progride”.
Em suma, nenhuma das duas teorias explica a dinâmica em torno dos fracassos repetidos. Por isso, os pesquisadores decidiram criar um modelo que explicasse esse ponto.
Um preditor seguro do sucesso
O modelo criado pressupõe que cada tentativa tem vários componentes, como a introdução e as seções de orçamento de propostas de financiamento, por exemplo, ou a localização e as táticas usadas em ataques terroristas. É importante ressaltar que, mesmo se uma tentativa falhar de modo geral, alguns de seus componentes ainda podem apresentar êxito. Ao se desenvolver uma nova tentativa, a pessoa deve escolher, para cada componente, voltar à estaca zero ou aprimorar a versão de uma tentativa anterior (fracassada).
Avalia-se os componentes de suas tentativas anteriores com base no feedback de outras pessoas (para as pessoas na análise de Wang, o feedback pode vir do NIH, dos investidores de risco ou chefes de organização terrorista).
No entanto, o modelo reconhece que algumas pessoas aprendem com suas tentativas fracassadas melhor do que outras, sendo que aqueles que “aprendem mais” incorporam mais componentes de suas tentativas fracassadas em suas tentativas posteriores.
Em um extremo, os piores aprendizes não incorporaram informação alguma de suas tentativas anteriores, começando do zero em todos os componentes todas as vezes. No outro extremo estão os aprendizes perfeitos, que levam em consideração todos os seus fracassos anteriores a cada nova tentativa. A maioria das pessoas se enquadra nalgum ponto entre os dois extremos descritos.
Embora os aprendizes perfeitos provavelmente alcancem o sucesso com maior rapidez, o modelo prevê que os piores aprendizes têm poucas chances de sucesso, uma vez que nunca aprendem nada, mas simplesmente "procuram novas versões", diz Wang, perdendo tempo valioso ao voltar à etapa da concepção do projeto repetidamente.
Os pesquisadores testaram esse modelo com seus dados, usando o tempo médio entre as tentativas como um fator representativo da capacidade de aprendizagem do indivíduo (uma vez que os melhores aprendizes começarão do zero em um menor número de componentes, permitindo-lhes produzir novas iterações rapidamente).
O que os autores descobriram foi uma relação surpreendente entre a aprendizagem e a eventual vitória. Não se trata do fato de que cada unidade adicional de aprendizagem aumenta igualmente as chances de sucesso de um indivíduo. Em vez disso, há um limite específico de aprendizado que separa os eventuais sucessos do restante.
Wang compara esse limite com a transição entre água e gelo. “Imagine ir de -5 a -4 graus Celsius”, explica ele. “Não acontece nada. O gelo continua sendo gelo.” Mas no momento em que a temperatura atinge um determinado ponto elevado, começa a derreter.
Da mesma forma, se a capacidade de aprendizado de uma pessoa está abaixo do limite, é como se não estivesse aprendendo nada. Pode haver melhorias um pouco com o passar tempo, diz Wang, mas as pessoas nunca reterão componentes bons o suficiente para produzir o verdadeiro êxito.
Aqueles que estão além do limite devem reter lições suficientes para seguir adiante e garantir o sucesso. Eles produzem novas iterações cada vez mais rapidamente ao longo do tempo, até que finalmente tenham sucesso.
Em termos práticos, isso significa não ser necessário aprender com todas as experiências anteriores para se ter sucesso, explica Wang. Mas há um número mínimo de fracassos necessário para haver aprendizado. Embora não seja facilmente quantificável em todos os casos, os pesquisadores identificaram o limite de três para as verbas de pesquisa do NIH.
O modo como se fracassa determina o sucesso
A pesquisa descarta a ideia padrão de que o sucesso é produto de puro acaso e também lança uma nova luz sobre o que é realmente necessário para um amador se tornar vencedor.
Simplesmente “tentar e tentar novamente”, por exemplo, não é suficiente. Os dados mostram que os indivíduos abaixo do limite de aprendizagem tentaram o mesmo número de vezes quanto os acima do limite, e provavelmente se esforçaram muito mais, uma vez que insistiram em fazer mudanças em partes perfeitas de suas tentativas anteriores. No entanto, esse trabalho árduo foi infrutífero, pois não incorporou as tentativas anteriores.
Para Wang, a lição é clara: as pessoas devem valorizar muito o feedback, bem como as lições que aprendem com o fracasso. “Esses são dois ativos muito valiosos existentes agora para realizar outra tentativa”, diz ele. Mas o estudo revela que só são valiosos se puderem incorporá-los em novas tentativas, reforçando o mantra do Vale do Silício de que “fracassar melhor” é a chave para o sucesso.
O estudo também desfaz o mistério por trás de quem tem sucesso e de quem não tem. Os pesquisadores descobriram que a capacidade de aprendizado de um determinado empresário, cientista ou terrorista pode ser discernida simplesmente medindo o tempo que passa entre as primeiras tentativas. Como resultado, o modelo criado foi capaz de prever com precisão quais empresários, cientistas e terroristas teriam sucesso muito antes de qualquer sinal externo de sucesso aparecer.
“Thomas Edison disse: 'as pessoas desistem porque não sabem o quão perto estão do sucesso'”, explica Wang. “Bom, agora sabemos a contribuição que essa pesquisa revelou. Se tivermos dados sobre como você fracassou, teremos uma ideia melhor de para onde você está indo.”