Strategy mai. 1, 2025
Como os incentivos salariais mais altos podem sair pela culatra
O aumento de bônus e taxas de comissão pode parecer uma boa ideia, porém pode prejudicar inesperadamente a qualidade da força de trabalho de uma organização.

Yevgenia Nayberg
Em meados da década de 1990, a Safelite, uma empresa de reparos de para-brisas, lançou uma jogada ousada. Substituiu os salários dos funcionários calculados por hora por remuneração baseada no desempenho, oferecendo a oportunidade de ganhar mais quanto maior fossem as instalações de para-brisas. Os resultados surpreenderam.
Dentro de um ano, houve um aumento de aproximadamente 44% na produtividade da empresa.
“Foi um aumento enorme", diz George Georgiadis, professor associado de estratégia da Kellogg School of Management e especialista em incentivos baseados no desempenho.
A razão para tal aumento de produtividade foi complexa. Cerca de metade do aumento deu-se ao fato de os trabalhadores se esforçarem mais. A outra metade deu-se a uma mudança no tipo de funcionários que a Safelite atraiu. “Os funcionários menos produtivos saíram da empresa e os novos contratados que os substituíram eram significativamente mais qualificados e produtivos", explica Georgiadis.
A história de sucesso da Safelite rapidamente se tornou um exemplo clássico na ciência econômica, ilustrando como o salário baseado no desempenho poderia aumentar a produtividade ao motivar os trabalhadores atuais e atrair melhores talentos.
Inspiradas por esse exemplo, muitas empresas passaram a acreditar que um crescimento contínuo de incentivos, como bônus, comissões ou opções de ações, naturalmente atrairiam os melhores talentos e aumentariam ainda mais a produtividade. Na verdade, muitas empresas focadas no crescimento, incluindo gigantes da tecnologia como Google e Netflix, adotaram estruturas de incentivo cada vez mais generosas, na esperança de atrair e reter os melhores talentos e manter os lucros sempre em alta.
No entanto, apesar da popularidade generalizada, essa abordagem tem um ponto cego crítico. Pressupõe que o aumento dos incentivos sempre leva a uma melhor seleção de funcionários - que atrairá mais trabalhadores altamente qualificados e produtivos. Porém, a pesquisa de Georgiadis e do colega Henrique Castro-Pires, da Universidade de Miami, desafia essa suposição.
Os resultados obtidos desse estudo sugerem que maiores incentivos não garantem automaticamente melhores contratações e, em alguns casos, podem até mesmo ser prejudiciais.
As desvantagens ocultas de maiores incentivos
Tendo isso em mente, Castro-Pires e Georgiadis criaram um modelo matemático para estudar como os futuros funcionários responderiam a mudanças nas estruturas de remuneração baseada em incentivos.
O modelo leva em consideração o seguinte cenário:
Um empregador, como o gerente de uma organização, anuncia um cargo que oferece remuneração baseada no desempenho.
Os possíveis candidatos, de diversos níveis diferentes de habilidade, decidem se candidatar baseado no quanto é atraente a estrutura de remuneração em comparação com as outras oportunidades de trabalho disponíveis. Cada candidato passa por um teste onde candidatos altamente qualificados têm maior probabilidade de aprovação do que os candidatos menos qualificados. Por conseguinte, o empregador escolhe quem contratar entre os candidatos que passam no teste, e cada trabalhador contratado decide o quão duro trabalhar.
O bom senso indica que o aumento dos incentivos naturalmente atrairia candidatos mais altamente qualificados. Porém, os pesquisadores descobriram que incentivos mais altos tendem a atrair tanto candidatos mais qualificados quanto menos qualificados.
Na verdade, dependendo do mercado de trabalho, maiores incentivos podem atrair desproporcionalmente trabalhadores pouco qualificados. Trabalhadores altamente qualificados geralmente têm mais e melhores oportunidades de emprego do que os menos qualificados, o que os torna relativamente escassos no pool de candidatos. Consequentemente, o aumento de incentivos pode, sem querer, aumentar a proporção de candidatos pouco qualificados, prejudicando assim a qualidade da força de trabalho do empregador.
“Aumentar os incentivos não é uma solução mágica para a seleção de trabalhadores", diz Georgiadis. “Em algumas situações, pode na verdade prejudicar a seleção de quem se contrata. Por isso, as empresas precisam pensar de forma ativa sobre como estruturar incentivos para melhorar a gama de candidatos”.
Um exemplo em vendas
Tomemos como exemplo os funcionários de uma loja de departamentos comum. Uma vez que o salário se baseia em comissão, os vendedores da loja podem ser incentivados a vender mais se o gerente aumentar a taxa de comissão de, digamos, 5% para 7%.
À primeira vista, a taxa de comissão mais alta parece um chamativo certeiro para atrair melhores talentos. Afinal, vendedores qualificados geram mais vendas, então se beneficiariam mais de comissões mais altas.
No entanto, a realidade é mais matizada.
Quando a taxa de comissão aumenta, o cargo se torna mais atraente não apenas para colaboradores altamente qualificados, mas também para os menos qualificados. Assim, mesmo que candidatos altamente qualificados possam se beneficiar mais da comissão mais alta, pode haver um número maior de candidatos menos qualificados atraídos pelo maior potencial de rendimento do trabalho. E se o pool de possíveis candidatos menos qualificados se expandir mais rapidamente do que o de candidatos altamente qualificados - algo que pode acontecer facilmente, dependendo do mercado de trabalho para vendedores em lojas de varejo - então o aumento das comissões pode realmente levar a uma contratação proporcionalmente maior de associados menos qualificados, prejudicando assim a qualidade geral da força de trabalho da loja.
Assim, "é preciso levar em consideração sistematicamente como os incentivos podem atrair involuntariamente candidatos menos qualificados, em vez de assumir que incentivos mais fortes melhoram automaticamente a qualidade da força de trabalho", diz Georgiadis.
Passos práticos para os empregadores
Embora o modelo dos pesquisadores não forneça uma solução de tamanho único para todas as situações possíveis, ele oferece orientação prática para empresas que buscam otimizar as estruturas de incentivos salariais.
Georgiadis sugere que os empregadores criem incentivos que atraiam especificamente os funcionários altamente qualificados mais do que os menos qualificados.
“Se simplesmente aumentar o salário de forma geral, todos se beneficiarão e mais pessoas se inscreverão em ambos os pools", diz Georgiadis. “Porém, se reestruturar os incentivos para que aqueles funcionários altamente qualificados fiquem em melhor situação, enquanto os menos qualificados não, você melhora a seleção atraindo mais funcionários altamente qualificados".
Evidentemente, falar é mais fácil do que se executar tal feita. Os empregadores raramente têm informações completas sobre as opções de trabalho alternativas dos candidatos, suas habilidades exatas ou suas preferências.
Para resolver esse problema, Castro-Pires e Georgiadis propõem um método direto pode ser usado pelas empresas para pelo menos avaliar se as mudanças que fazem nos incentivos melhoram de alguma forma sua seleção de força de trabalho.
Os empregadores precisariam rastrear duas simples medições antes e depois de fazer um ajuste na estrutura de incentivos: a quantidade total de candidatos e a quantidade de candidatos rejeitados durante a triagem inicial. Se a quantidade total de candidatos aumentar mais do que a quantidade de candidatos que não passam na triagem (em termos percentuais), isso indica uma seleção aprimorada - ou seja, mais candidatos altamente qualificados estão sendo aprovados pelo processo de triagem.
Além disso, os pesquisadores criaram um teste em duas partes que pode ajudar os empregadores a identificar a estrutura de incentivos ideal.
Primeiro, o empregador precisa fazer um pequeno ajuste na estrutura de incentivo-salário antes de contratar funcionários e observar como isso afeta a quantidade total de candidatos, bem como a quantidade de candidatos não aprovados na triagem. Este experimento permite inferir todos os ajustes de incentivo que melhoram a seleção de trabalhadores.
Em seguida, após contratar os funcionários, o empregador precisa fazer um segundo ajuste nos incentivos e acompanhar como a produtividade dos funcionários responde a essa mudança. A combinação de dados desses dois experimentos fornece informações suficientes para que os empregadores identifiquem o esquema de incentivo ideal para a situação.
“Na verdade, há infinitos cenários que precisam ser considerados", diz Georgiadis. “Mas um resultado importante mostra que, sob certas premissas, os dados desses dois simples testes são suficientes para orientar os empregadores rumo a uma melhor estrutura de incentivos”.
Abraham Kim is the senior research editor of Kellogg Insight.
Castro-Pires, Henrique, and George Georgiadis. 2025. “Incentives and Selection.” Working paper.